terça-feira, setembro 12, 2006

Blues and Drops

...ela pegou o drops esquecido na mesa ao lado da cama. Velho hábito, do outro século. A embalagem, cuidadosamente fechada. Sorriu. Quase como se estivesse inteiro. Se fosse seu, a embalagem estaria rasgada e toda aberta, simplesmente porque não conseguia fechar as coisas, sorriu colocando um dos drops na boca. Precisava mantê-la ocupada. Alma blues. Distração e densidade arrastando-se... Boca, corpo todo, pensamentos... Drops na boca, ficou ali, pensando em seu dono. Do drops. Às vezes, blues. Às vezes, hard. Ares de amo e senhor que gostava de acreditar que era seu dono, e que ela gostava de fazê-lo acreditar que era seu dono. Liberdade. Faz de conta. Ou era mesmo? Ficou ali, Mordendo. Esquartejando. Mastigando. Saboreando o drops cítrico, fruto selvagem que se espalhava na boca, generoso. Saboreando, pensando na espiral que faz a volta para mover-se novamente com mais força e pulsão. ...em espiral porque sente que há coisas difíceis de dar forma porque se recusam a serem enquadradas, a ter limites. Há o que transborda, e que talvez por isso pareça uma espiral. Espiral. Não em linha reta, como se não houvesse ontem, ou amanhã. Não em círculo, que se fecha sem saída. A espiral, leu em algum lugar, projeta-se em retornos e avanços. ... transborda. Pensa que não sabe como, nem em qual direção. Porque talvez não importe a direção, em alguns momentos. O que importa é o que se traz para dentro. Importar, do latim importare, significa trazer para dentro, prá si. ...o que não importa. Sente, ressente. Quando o outro não importa, não traz para dentro, parece que as coisas não transbordam. Arrastam-se em círculos, e de repente, parece que é a gente que se move em círculo. Mas não dá pra fazer círculo porque transborda. Sente que quando a gente se importa, traz para dentro o que de melhor vem do outro. E que passa a fazer parte nossa também. Quando a gente se importa, em relação, a gente se desloca, não importa a direção. O que importa é que a gente desloca a existência. A gente se muda. Muda a alma de casa, como diz Mario Quintana.
O drops dissolveu-se em sua boca, gostava de seu sabor... estaria virando um velho hábito?
A nona lua da espiral